sábado, 17 de julho de 2010

Besta é tu

Na estreia oficial do In-pessoa, o já antológico "Live at Forest´s House - Tormenting the Neighborhood", aconteceu um negócio curioso, sem deixar de ser corriqueiro. Folheando a Rolling Stone deste mês, cai nas mãos do Renato a reportagem sobre "o melhor disco da música popular brasileira", o Acabou Chorare (Novos Baianos, 1972). E ele desce a lenha, não exatamente no disco, mas nessa mania de pegarem de tempos em tempos alguma banda brasileira para Cristo, não para crucificar, mas para fazer de O Novo Messias da MPB.

Concordo com o Renato - é um verdadeiro porre esses críticos disfarçados de Indiana Jones o tempo todo caçando o tesouro da música brasileira, quando na verdade, ninguém devia levar muito a sério estas listas. Podem ter algum fundo de razão, mas eleger um único disco como representante da brasilidade musical equivale a procurar agulha no palheiro. Lembro de coisas tão distintas quanto Chega de Saudade (João Gilberto), Elis e Tom e Da Lama ao Caos (CS& Nação Zumbi) serem alçados a este posto.

Aliás, faz algum tempo que desisti do rótulo MPB. Como todo rótulo para arte, é arbitrário e reduz mediocremente o que tenta rotular. Olha só: música brasileira pode ser samba, choro, coco, maracatu, carimbó, xote, manguebeat, guitarrada, lundu, maxixe, fora os ritmos vindos de fora e incorporarados ao nosso repertório e a infinidade de ritmos nacionais que ficaram de fora destas linhas. E MPB, o que é? Chico, Caetano, Gal e Betânia. E o rock brazuca dos anos 80, não é Música, Popular e Brasileiro? E essa "nova MPB"? Colocar Maria Gadu ao lado de Chico Buarque na mesma prateleira é uma coisa tão esdrúxula que só o Nelson Motta mesmo para fazer e tentar nos convencer que é jóia! Troféu Joinha para ele.

Mas não deixo de adorar o Acabou Chorare, tanto que graças à reportagem da RS e o desabafo nervoso do Renato, eu lembrei de baixar para matar a saudade. Em 2005, assisti no SESC Pompeia a um show que reproduzia o álbum na íntegra com gente muito diferente tocando junto, o que literalmente botou abaixo a plateia do teatro. Todo mundo desceu das cadeiras e caiu na dança!

Antológico, divertido, e ainda honrou o original. Direção musical de Rômulo Fróes. A Baby fez o papel de testemunhar que toda aquela loucura aconteceu de verdade um dia, e até esqueceu um pouco das suas crentices. Lanny Gordin, genial guitarrista, fez as vezes de Pepeu, já que foi seu primeiro mestre. Davi Moraes, que também foi morador daquele sítio lisérgico, representou o pai Moraes Moreira. Lampirônicos exerceram a função da Cor do Som, o conjunto dentro do conjunto. Elza Soares e Luiz Melodia também estavam lá.

Quem ouvir somente o disco, ignorando o blá-blá-blá da crítica, com certeza vai gostar. Simplesmente porque é vibrante, alegre, criativo. Tem raízes brasileiras, mas também é rock n´roll, como em Um Bilhete para Didi. Gosto do timbre jovem e anti-virtuosísitico da então Baby Consuelo em Tinindo Tricando e A Menina Dança, da delicadeza de Acabou Chorare, da doideira de Mistério do Planeta e Swing de Campo Grande. Também tenho uma ligação sentimental com Preta Pretinha, porque lembra meu apelido de criança, Preta. (No caso, meus cabelos.)




Imagino que quando essa galera maluquete se reuniu, eles não pretendiam genialidade. Nesse ponto, todas as bandas (pelo menos as bacanas de se ouvir) são iguais: só querem saber de tocar e se divertir. Quem coloca a vontade de ser aprovado antes da vontade de fazer música, se lasca. O reconhecimento, da crítica ou do público, vem como acréscimo.


Então, um grito para a crítica: Besta é tu! Deixem as pessoas saborearem sem análises prévias!

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