quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Abduzida por Tantra e Van Gogh



Fui abduzida por uma canção, há poucas horas. De vez em quando tocava no rádio e eu nem ligava muito pra ela, apesar de ter simpatia pela banda que toca. Na Antológica Festa da Chapinha, a última, que teve de tudo, desde ex-aluna presenciando minha esbórnia com meus queridíssimos amigos da Velha Guarda até fim de festa deprê em grau máximo, eu vi os meninos comentando que a canção "Corvos sobre o Campo", foi inspirada na tela "Campo de trigo com corvos", de Van Gogh. E aí, a lembrança empoeirada me veio a mente, mas não me retive muito nisso, porque O Menino que eu Gostava curtia essa banda. Ia dar curto-circuito lembrar, ainda mais naquele dia.



No último ensaio da nossa banda sem nome - o desespero é tanto que estou pensando em até fazer enquete com alguns nomes surgidos - o Renato, nosso caçula e genial guitarrista e talvez o único que tenha algum juízo na cabeça, comenta que só os primeiros versos realmente falam da imagem do quadro. Eu não exatamente discordei, porque não lembrava da letra toda, mas lembrei a ele do Universo Pirante que é Van Gogh, que seria impossível esgotar uma tela em uma canção, que dirá nos primeiros versos. Pausa para o café. Ou melhor, pra cerveja.



Do nada eu estava cantarolando essa canção na terça-feira, na mesa do bote, com a porção Velha Guarda da Banda, e Forrest me diz que é essa canção é ótima. Por sorte, lembrei de procurar e baixar hoje, qual a surpresa com o resto da letra, que vai por um caminho estranho mesmo, o que é absolutamente normal se lembrarmos que estamos falando de Vincent Van Gogh. O fato que a letra sou eu nos últimos tempos.



Como estou me despedindo definitivamente da minha dor, afinal há sobrevida depois da Pior Dor-de-Cotovelo da História, resolvi publicar a tela, com a letra de Corvos sobre o Campo. Não vou analisar a canção, nem dar o histórico do Tantra, porque acho que nosso baterista e último a ser escolhido nas aulas de Educação Física faz isso mil vezes melhor que eu. Só digo que fico satisfeita em redescobrir que os anos 90 produziu um bom rock brasileiro, ao contrário do que eu sempre disse. Corvos sobre o campo* é uma pequena maravilha, em termos de rock com pegada pop, feita para tocar no rádio a valer, e com uma letra bonita e criativa, cheia de poesia. É tudo que nós e nossa banda inbatizável queremos fazer.



Corvos sobre o campo - Tantra



Céu azul, campo amarelo

Corvos avançam em nossa direção

E não há porque se assustar

Deixa o medo entrar no seu coração



Tudo o que eu fiz foi por amor

Acho até que encontrei

O motivo de um final feliz

Nunca imaginei o nosso fim

Construí meu castelo com as pedras que eu te atirei



Yeah, yeah, yeah, nada vai durar

As maldades serão coisas belas, enfim

Nada vai durar tanto assim

Abra os olhos, então

Olha os corvos sobre o campo



Céu azul, campo amarelo

Corvos avançam em nossa direção

Vermelhos caminhos, ecos de cores

Vaga pulsação, de clara escuridão





...Minha dor se despede com a beleza lisérgica de Van Gogh. Deixa o medo entrar em seu coração. No meu, só cabe alegria agora.




Nota 'inutiél':



*Agora já tem Corvos sobre o campo no 4Shared.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

O dia em que fui trabalhar na Bienal do Livro


De volta aos boletins da minha dura vida na Ilha de Caras que não interessam a ninguém, mas que insisto em fazer. A última vez que fiz isso foi quando relatei a minha emocionante estréia no mundo dos testes para atriz-teza, semi-cega, sozinha e na chuva. Nem pude ver a cara de desgosto do Hugo Possolo com meu teste, cheio de buracos de esquecimento no texto, rsrsrs.

Hoje fui à Bienal do Livro, fugindo descaradamente do instinto defenestrador de alunos que me atacou essa semana e da rouquidão -estou prestes a ficar afônica e estou sim desesperaaaaaada! Como é que vou gravar a voz da demo da nossa banda sem nome? Aulas são mero acessório nesta história - e antes dei uma passadinha no médico pra ver se dou jeito nesta tosse de cachorro. Pausa para esclarecimento - o posto não dá atestado médico, ou seja acesso negado para fugida estratégica do trabalho por vias malandras tradicionais que todo vagabundo que se preza conhece.

Na real, entrei pela porta da frente da Bienal. Porque sexta passada eu descobri que eu poderia ir à Bienal hoje, assinando ponto lá e ainda ganhando o dia de trabalho, bastava levar o holerite - atestado de pobreza e insanidade do magistério. (E nenhuma boa alma para divulgar isso na escola. Por que será??) Como eu não consegui confirmar esta notícia, eu passei no médico antes.

E essa visita ao médico merece uma parada especial, porque eu sou o Bozo de Calça Amarela. Reclamei de tosse seca por tempo prolongado e ganhei um pedido de exame de tuberculose. É, isso mesmo! Sou uma tísica em potencial. Sendo que não tive febre e tô 'gorda lisa', como diz a minha mãe. Sendo que tenho rinite e sofro com tempo seco, desde que me entendo por gente. Sendo que contei que sou professora em turno duplo e faço esforço vocal constantemente. Ainda assim, tive que cuspir no potinho - eca! (Ops, na verdade é teste de escarro, mas a minha tosse é seca. Não tem nem vapor d´água pra escarrar) e amanhã tenho que levar de novo meu cuspe para análise. Cuspe em jejum, coisa duplamente nojenta.

Livre da sina dos cuspes, eu corri pra Bienal. Com medo, afinal eu sou formiguinha, operária-padrão, com marmita e livro-ponto. Não é coisa à-toa fugir do trabalho na cara larga. Mas como eu descobri que era verdade que eu ganharia o dia na Bienal, se fosse hoje, eu não fugi do trabalho, fui trabalhar na Bienal. Com credencial e tudo, porque apresentei meu atestado de pobreza e insanidade e peguei credencial. Na sequência, fui falar com os representantes dos 'patrão' e fui muito bem recebida, diga-se de passagem. (Nota brechtiana¹: por que será que pobre adora essas pequenas provas de status, né? A 'crasse' média também gosta, então tá tudo em casa!)

Fui zanzando por lá, comprei alguns livrinhos e assisti a um bate-papo com o João Batista de Andrade, cineasta brasileiro pra lá de consagrado e diretor de O Homem que Virou Suco, filme genial, na minha modesta opinião. Comprei o livro-roteiro do filme e peguei autógrafo do cara, super boa gente. Comentei da passagem deste filme na minha vida, e como ele me influencia e tal.

Na verdade eu tinha me esquecido que ele iria participar da Bienal, fui atraída para o local da palestra por "forças estranhas". Meu destino foi desviado por um daqueles chatos que vendem livro de poesia na porta do MASP, que me assaltou com meu aval. Como eu fiquei dura, tive que sacar dinheiro para comer. Do lado do caixa eletrônico tinha uma lanchonete e o estande onde o João Batista estava.

Gosto de acreditar que a gente segue o caminho certo sem roteiro, desde que a gente saiba o que quer. Isso até me consola, já que sou uma perdida de carteirinha. É o triunfo da intuição hipertrofiada feminina que me persegue, e às vezes até me contraria. Tudo isso me fez sair do Anhembi dando pulos secretos², tal e qual uma bicha legítima presa num corpo feminino que sou³.

Saldo da epopéia: ganhei duplamente o dia, porque fiz tudo isso trabalhando!

E é para mim mesma esta cambalhota!
Notas inúteis:

1 - Princípio do Distanciamento, segundo Brecht. Se vira e vai pesquisar, estou com preguiça de explicar.

2 - Bozoca sempre sai pulando de felicidade quando consegue algo que quer muito, e eu também faço isso. Sua cunhada diz que isso é bichice pura, mas a gente pode, porque a gente É bicha, e das loucas.

3 - Tal qual Madonna e Bozoca, eu sou um viado (com 'i' mesmo) que nasceu num corpo de mulher. E tenho dito.

sábado, 16 de agosto de 2008

Madonna Cinquentona

Estava vendo clipes da Madonna até agora. Como hoje ela completa a bagatela de 50 aninhos, a primeira página da UOL está cheia de coisas sobre ela.

Eu nunca fui fã de Madonna de uma maneira específica. Quando eu era criança gostava de Papa Don´t Preach e Vogue - eu adorava aquela coreografia à la Macarena dessa música. Lembro também de quando ela esteve no Brasil - a turnê do The Girlie Show - que eu queria assistir na TV e que meu pai não deixou, afinal essa era a época em que ela estava pegando fogo, era o tempo do Erotica, Sex e Na Cama com Madonna. Sou filha de família de comercial de margarina, esqueceram?

Eu nem sabia que ela estava pra fazer aniversário, e ouvia de longe comentários sobre seu último disco elogiado - "só porque tem o Justin Timberlake", eu pensava, "mas que bosta!". (Eu vi o clipe de "4 minutes" e é legal. Gênios também se enganam, hehehe.)

Nestes últimos dias eu estava próxima da rainha do pop e não sabia. Eu tinha baixado o The Stonewall Celebration Concert, o primeiro álbum solo do Renato Russo, que, 'por increça que parível', eu não conhecia. Ele gravou Cherish, da Madonna, canção que eu mal me lembrava (se é que eu conhecia) e fui abduzida por essa música. Fui atrás da original, é claro. Mal acreditei que Cherish é dela, porque é uma canção totalmente fofa, singela. Também tenho ouvido muito as versões do Trash Pour 4 de Material Girl e Like a Virgin, incrivelmente reiventadas.

Fui navegando sem perceber por este especial da cantora, porque, por mais que eu não tenha lembranças especiais dela - fora essas que eu contei - me impressiona como ela se mantém diva indiscutível do pop, um mercado com fama de ser superficial e descartável.

Nos anos 80, quando ela surgiu, e depois nos anos 90, sinônimo de pop era Madonna e Michael Jackson. Ele, a gente já sabe que fim levou, foi tragado pela areia movediça da sua vida pessoal, que todos sabemos como é difícil e cheia de lances bizarros. Enquanto Michael estava em tribunais por seus escândalos de pedofilia e brincando de "vamos jogar Isabella" com seu filho (agora que me dei conta - ele é que começou essa moda), Madonna continuava a lançar seus discos, sem alarde. Dizem que ela ainda é controversa e polêmica, mas acho isso coisa da imprensa marrom. Acho que ela não precisa provar mais nada pra ninguém. Por isso, ela pode tudo, até beijar Britney Spears (eca!) ou interpretar Evita Péron, quase matando os argentinos do coração.

Não conheço quase nada da sua fase mais recente. Lembro só do Ray of Light, da trilha de Evita e só. Fui dar uma olhada e ainda prefiro a Madonna platinada dos anos 80 cantando Like a Virgin. Mesmo não gostando tanto exatamente do que ela tem feito hoje, é de cair o queixo a sua capacidade de ser reiventar e ainda ser Madonna. Só que isso não é de hoje. Desde o início da sua carreira, ela foi uma mulher de contrastes. É só olhar o clipe de Material Girl, com um final totalmente antagônico ao que diz a letra e o próprio clipe. Genial.




Suas controvérsias e contradições mais notórias dançam entre o sagrado e o profano. Para começar, quis o destino que ela se chamasse Madonna - ícone religioso de Maria segurando o menino Jesus ao colo. E ela sempre gostou de brincar com estes contrastes. Ela aparece rezando em um figurino discreto em La Isla Bonita, alternando com um figurino de dançarina de flamenco megavermelho - há uma certa cafonice nesse clipe, o que me faz gostar dele (Risos).




Quem é mulher sabe como é difícil equilibrar estes dois pólos. A gente não quer ser condenada por querermos ser gostosas, absolutas, devoradoras, mas também acha às vezes ser "menina de prédio criada pela avó" um porre. A maioria de nós fica no meio termo disso, ou então nega um dos lados por completo, o que causa 10 entre 10 das neuroses femininas. Madonna, não. Ela dilatou as duas polaridades e vai de uma a outra com um pé nas costas. Veja só a sua vida. A Material Girl virou estrela de comercial de margarina - casou, teve filhos, adotou um - e continua aparecendo gostosona em seus clipes. Isso é Madonna.

Então, gostando ou não dela, sendo fã ensandecida ou não, da mesma maneira chego à conclusão: loiras ou morenas, toda mulher deveria ser Madonna e mangar do tempo e dos clichês que nos perseguem. Idealismo ou não, toda mulher tem a capacidade de ser maior que estes estereótipos que nos impõem. Ela fez 50 anos! E eu aqui, com medo dos 30. Ah, meu. Tomá no uc, mermão.
Ah, e só pra provocar, escolhi uma foto da cinquentona quando ainda era ninfeta e morena, como eu. Esperá só eu chegar aos 50, ninguém me segura.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Canções que acabam antes do fim

Meninos, meninas e similares. Calipígios e onanistas,

Minha parca e seleta audiência, o silêncio de ultimamente não foi proposital. Ando calada pela dor de uma ausência banal. Como é banal, não me dei ao trabalho de chatear meus leitores por conta de uma estupidez que não é minha.

Agora, porém, vamos ao que interessa. Tenho falado muito de música ultimamente, porque é esta é uma paixão constante na minha vida, e na vida de muitas outras pessoas também. E quando eu acreditava que a música era para mim um sonho perdido, eis que ela bate à minha porta novamente - quase do nada. Eu larguei a música durante um tempo, mas ela não me largou.

Existem canções de diversas durações. Podem ser breves quanto uma canção comercial, para tocar no rádio ou durarem mais de uma hora, como uma sinfonia. Não importa a duração, canções tem que ter começo, meio e fim. Conclusão, fechamento.

Pensem em alguma música, a preferida, daquelas que são capazes de tirar a gente deste mundinho chato enquanto a gente ouve. Você está lá, pirando no seu som preferido. E de repente alguém desliga e a canção acaba, sem aquele "lá-lá-lá" do final. Simplesmente cessa. Chato, né? Um verdadeiro balde de água fria. Pois então, assim pode ser a nossa vida. Acabar antes que a canção se complete, como se do nada a pilha do rádio acabasse. Eu não tenho medo que a minha canção dure pouco e sim de que ela acabe antes do fim. Foi o que aconteceu com um colega de trabalho na última sexta. Sua canção parou de tocar de uma hora para outra. Aliás, quando ela estava apenas começando. Eu não consigo deixar de achar isso estúpido.

Por mais que a gente saiba de cor e salteado da fragilidade da nossa vida, a gente nunca aprende: sempre se acha invencível. E a nossa canção também pode acabar antes do fim, como a do Vinícius ou a do Chico (no último dia 29 fez um ano que sua canção parou de tocar). E assim, caímos sempre no mesmo erro, tal e qual um disco riscado, movidos pela mesma prepotência arrogante de sempre, o que faz a nossa canção desafinar.

Se eu falar mais alguma coisa sobre o fim da nossa canção, cairei em clichês, em melôs manjadas de Karaokê¹. Não resisto, porém, ao charme dos clichês mais piegas, por serem os mais sinceros e verdadeiros, apesar de nada criativos.

Fecho, então, com o mega-clichê sobre a morte, em uma das canções da Pitty, que não figura entre as minhas compositoras favoritas, mas vá lá: "Não deixe nada pra depois, não deixe a vida passar/ Não deixe nada pra semana que vem, porque semana que vem/Pode nem chegar."

(Espero que nossas canções cheguem até o fim. E isso não é só questão de fatalidade, inexorabilidade. Uma pequena parte da composição cabe à nós, acreditem. Os meninos não tiveram tempo de concluir as deles, mas pode ser que a gente tenha mais sorte. É melhor aproveitar.)