terça-feira, 9 de agosto de 2011

Sobre o tempo II

Enquanto a maioria ainda insiste em esticar seus cabelos para baixo com ferro quente, ela se ocupou em levantar o seu num legítimo beehive casa-de-maribondo. Enquanto uma meia-dúzia de louras-aguadas ainda insistem em poses sexy com dedinhos fake na boca;  sua cabeleira, negra e revolta, fez questão de ir na contramão. Enquanto os nossos, com iPads na mão e notícias em tempo real,  ainda desejam ser antenados com seu tempo, ela voltou aos 1950´s e se travestiu de diva da Montown. Enquanto um monte de gente ainda faz inúmeras tentativas - frouxas, ridículas e sem sucesso - de serem cada vez mais e mais  fitter, happier, more productive* (à base de academias, livros de auto-ajuda, dietas frustradas e Prozac)  tentaram faze-la ir para a reabilitação. A resposta a gente já sabe: No, no, no!





Este desejo de ser contemporâneo é mais velho que o mundo.  É o mesmo que nos faz datados, amarelados pelo tempo. Aquele que causa espanto, estranheza ao fazer com que a gente se reencontre com uma versão velha de si mesmo. (Atire o primeiro álbum de fotografias quem se viu numa foto antiga e agradeceu aos céus por não ser mais aquela imagem, que mesmo mais velho, com mais dores para contar, deu graças a Deus porque enfim o tempo passou).

No passado, quisemos ser modernos.  E agora, queremos ser o que, contemporâneos, pós-contemporâneos? E no futuro, quereremos o que? Ser uber-ultra-right-pós o que?

A passagem do tempo é outra discussão datada, literalmente. O tempo só é linear em aulas de História e Gramática, porque de resto, nunca foi.  A piada mais velha do mundo pode ser a Descoberta da América pelo Twitter para quem ainda não ouviu.

Às vezes eu me divirto sendo retrô-de-mim-mesma, como a minha volta ao chanel-curumim, ou aos óculos de Velma. Em outras feitas, o que eu mais quero é não me reconhecer em nada, atirar-se no abismo do futuro é capaz de nos proporcionar um tesão irrepreensível.  Em outras, ainda, o foco no presente é tão grande que nem sequer me lembro de toda essa bobagem. Aos 28, percebi: eu sou aquilo que eu sempre fui, o que pareço ser agora e o que eu ainda vou ser. Tudo ao mesmo tempo agora. Lembrando que o verbo ser é uma falácia. Não somos absolutamente nada, somente estamos. E tá bom demais.

Assim, voltamos às origens. Ser original é isso, afinal. A ela isto nunca faltou, uma verdadeira antítese barroca: profundamente original no seu desejo de ser retrô, contrário a todo esforço da nossa geração em se fazer original e não passar de cópia (mal feita, o que é pior). Pensa rápido: quantos ensaios de moda inspirada no estilo da Amy você já viu? Pois é, inúmeros. Todos se pretendendo Invenção da Pólvora. Todos cópia.

Sinto falta de Amy. Já sentia antes mesmo dela morrer. Ela, que quando surgiu no cenário, foi pura subversão, morreu como um arremedo tragicômico entre o que ela foi e o que poderia ter sido. Fiquei puta com ela por isso. Mas acho que ela nem estava muito aí para essas coisas, ela era de levar água para os papparazi que se aboletavam na porta de sua casa! Loucos não estão neste mundo para servir aos interesses das pessoas na sala de jantar, a não ser que isto lhes interesse. E ela, de tão louca, mais de amor por aquele babaca, do que pelas drogas em si, não percebeu a hora de tocar o foda-se outra vez e voltar a ela mesma. Se ela chegou a  perceber, foi tarde. E esta foi a triste constatação de quem assistiu aos seus shows na fase da derrocada, já havia cantado essa bola.   Sábias palavras do Rafa: A Elis morreu de overdose, mas com a voz inteira! A Amy poderia pelo menos usado as drogas certas!  Ressuscita, Amy!

Este textículo passa longe de homenagens, que é para mim o que há de mais ridículo neste mundo, sendo elas póstumas ou não. Ele é mais para dizer que lá se foi minha última heroína trágica. No último dia 23, ela se juntou ao mesmo panteão de loucas, subversivas e desajustadas como Pagu, Maysa, Frida Kahlo, Billie, Piaf. Não que eu queira me ajustar, mas não posso mais sonhar com um mundo que não existe mais, e é tão engraçado que eu tenha dito isso para o professorzinho dias antes de Amy bater a caçoleta oficialmente. Tenho sérios planos de ficar velha, e quanto mais velha eu ficar, tanto mais louca de pedra também! O tempo nos atualiza. Então, já dá pra perceber que o desejo do contemporâneo também está em mim, o que eu considero bem válido, até. É só não se levar muito a sério.

She´s reborn like Sarah Vaughan!

Nenhum comentário: