sábado, 23 de outubro de 2010

Tropa de Elite 2


O coronel em seu lado humano e desarmado

Fui assistir Tropa de Elite 2 pensando: eu vou porque o Capitão Nascimento (Wagner Moura) é o cara - ops, agora é coronel. Logo no início do filme, percebe-se que nem tanto, mestre: o conflito da trama começa com uma cagada típica da polícia brasileira, não só da carioca: o dedinho que coça no gatilho na hora errada, vide casos como do sequestro da Eloá e do ônibus 174. A diferença é que nos casos reais morreram as vítimas, na ficção o Mathias (André Ramiro) acerta o bandido. Bom de pontaria, mas mesmo assim "puta dum mané, parceiro!" Simplesmente porque seu superior - o coronel - tinha mandado não atirar, ficar só de espreita. O que o zé-ruela fez? O total oposto, invadiu e atirou pra matar. Mesmo assim, o coronel dá cobertura para o amigo e toma a responsabilidade para ele, talvez porque no fundo era isso mesmo que ele queria fazer: mandar matar!

Esse tiro bem dado num traficante fudidaço em Bangu I muda a vida do Nascimento. "Os intelectuaizinhos de esquerda" e a imprensa - leia-se Diogo Fraga (Irandhir Santos), atual marido da ex-mulher do coronel - caem matando em cima do BOPE e por pouco Mathias e Nascimento não se fodem de verde e amarelo sendo expulsos da corporação. Mas a opinião pública pressiona e a Secretaria de Segurança Pública promove o coronel para o Setor de Inteligência da Secretaria de Segurança Púlica e o Mathias se fode sozinho: é expulso do BOPE, voltando para um batalhão comum e o coronel não consegue livrar a cara do parceiro. Esse é o ponto de partida da trama.



José Padilha diz que não gosta de fazer "filme intelectual" e no caso do Tropa de Elite 2 ele acerta no ponto. É um puta filmaço - a pegada pop é tão forte que fiquei imaginando que o sangue que escorria da tela do cinema tinha gosto de groselha Milani. Impagável a cena dos policiais no "crematório" - a terra do presunto perdido - com um crânio incinerado na mão, citando sarcasticamente o famoso monólogo de Hamlet e o outro policial responde: "Ê, parceiro, que mal gosto ficar citando a Bíblia aqui!" "Ê, mas como você é burro, isso é coisa da novela!"




Tropa de Elite 2 é de fato uma pérola pop, da qual Tarantino se orgulharia. Duas horas e quarenta minutos que não se desgruda os olhos da tela. Esteticamente falando é perfeito, mas politicamente falando é um desastre. Como levantar a discussão de um tema tão sério - e complexo - sendo superficial? Sim, porque o raciocínio do coronel é absolutamente simplista, como se tudo fosse um western de mocinhos e bandidos. Na verdade o fim do filme marca a mudança de pensamento do nosso heroi controverso, ele percebe um pouco tarde que o buraco é mais embaixo. A impressão que se tem é que esta película não poupa ninguém - políticos, a polícia, a sociedade, a direita, a esquerda, a mídia - mas não se livra totalmente dos clichês, como por exemplo o dos direitos humanos e a esquerda - como se direitos humanos fosse coisa só para defender bandidos sanguinários e como se a esquerda tivesse sido sempre "paz e amor". No escritório do Fraga, o intelectual de esquerda e pacifista do filme, mostra ao fundo um cartaz do Marighela e em outro momento um cartaz com o logo do MST, movimento que defende a luta armada. Como é que vai ser guerrilheiro sem pegar em armas e matar, hein, parceiro? Sem contar que o filme ainda mostra a tortura policial como método de investigação. A única vantagem é que para a grande massa a discussão do filme mostra porque NUNCA vai haver legalização das drogas aqui, simplesmente porque o tráfico beneficia o "sistema", pagando iates e caviar para muita gente caishca grossa, como diria o coronel.


O filme de fato é muito bom, mas me fez mudar de ideia. Não acho mais que o coronel Nascimento seja o cara. O Wagner Moura sim é que o é. Apesar do personagem em si ser bastante fascinante, cheio de nuances e controversões, ele não teria metade do carisma que tem se não fosse a competência do ator que o interpreta.


Tropa de Elite 2 empolga, mas não dá nenhuma vontade de fazer justiça com as próprias mãos. Dá vontade de fazer cinema.