terça-feira, 15 de novembro de 2011

Pedro Rocha – A manteiga derretida mais dura na queda do mundo

Eu era como Pedro, o apóstolo xará: primitivo, turrão, porém havia em mim um coração enorme. Só que não encontrei nenhum Cristo para seguir, então, segui em frente. Troquei o tênis pelo mocassim, a mochila pela pasta e me tornei corretor. De imóveis. Vendi tudo que via pela frente: quitinete, mansão, casa na praia. Ganhei uma grana razoável para estudar e me tornar o mesmo executivo detestável que era o meu patrão. Contudo, eu era jovem ainda, não estava tão preocupado assim com meu futuro. Esse papo de faculdade era mais pra dourar a pílula e manter o meu emprego.

Típico machista idiota, de tanto esquecer meu próprio coração, esqueci que as pessoas têm sentimentos. Mulheres, principalmente. Preconceito bobo esse, porque homens também sentem, mas o fato é que antes do que me aconteceu eu sinceramente acreditava que homens não choravam.

Como num conto dos irmãos Grimm, me apaixonei por uma princesa e, de tanto pisar no seu nobre coração, ela tornou-se sapo ao invés de me transformar em um. Do contrário, passei a ter peitos e sangrar mês a mês e mais do que corpo, me deu mente e coração de mulher. Fui amaldiçoado. Tornei-me objeto do meu próprio desejo e o cartão de crédito não resolvia esse problema.

Entendendo meu objeto de desejo é que começou a penosa volta ao verdadeiro Pedro Rocha, a manteiga derretida mais dura na queda do mundo, de tênis e mochilão nas costas, durango e insatisfeito.

Essa princesa me fodeu. Mas ela jura que foi pro meu bem.

Janeiro de 2005


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